Os médicos e a pandemia
E no princípio tudo eram convicções e os semideuses criaram a estupidez. No dia a dia costumamos dizer que os médicos pensam que são deuses e que os juízes tem a certeza. Desses últimos trataremos depois, haja visto que os profissionais de saúde estão no momento em evidência e severa exposição, porquanto encontram-se na linha de frente no combate à pandemia pelo Covid 19, vivenciando desta feita um empoderamento perdido ao longo das últimas décadas. Estão, de alguma forma, por um lado ,sendo romantizados como deuses por uma população entre assustada e por que não dizer com um misto de pavor e por outro lado sendo utilizados pela mídia mas desprezados no seu labor e na sua missão de salvar vidas, por instâncias públicas e privadas que devem, e falo no presente e não no pretérito de que deveriam, cuidar com zelo de sua proteção pessoal para que os mesmos desempenhem esse trabalho com segurança num momento crucial da vida de toda a coletividade.
Em plena crise sanitária deparamo-nos com um Ministro da Saúde, médico ortopedista, que a quatro anos, enquanto deputado, escancarava uma plaqueta dentro do congresso nacional contra uma presidenta eleita democraticamente, portanto em favor de sua deposição, além de no seu desempenho parlamentar e de ministro da saúde ter ajudado a expulsar médicos de outros países que assistiam a milhões de brasileiros, no caso do Programa Mais Médicos. Isso sem falar no seu passado político cujos vínculos com planos de saúde e empresas de materiais médico hospitalares financiadores de suas campanhas para deputado federal não são nada, nada, transparentes. Este senhor, de forma hipócrita, posa para as câmaras da mídia chapa branca e cúmplice do golpe parlamentar, vestido de um jaleco com a logomarca do maior sistema de saúde do mundo do ponto de vista de garantias a saúde, no caso o SUS que ele ajudou a precarizar. Pois bem, esse é o retrato fiel da classe médica ali instalada assim como nos diversos níveis de atuação político institucional, por conta de sua visão elitista classe mediana, sua ignorância política e seu inconteste posicionamento escravista o qual acaba sempre derivando para posicionamentos partidários.

Não se apercebe, os médicos, da sua fragilidade enquanto classe trabalhadora dessintonizada com as garantias fundamentais relativas ao trabalho, assim como do seu poder político transformador para que tenhamos uma saúde pública forte e de qualidade como bem maior do cidadão.
Essa classe médica a bem pouco tempo desfilava em avenidas com camisas de seleção de futebol ou de jalecos brancos, berrando aos quatro ventos contra exatamente as políticas públicas que ele agora vê-se paulatinamente apeado, sem insumos, sem equipamentos de proteção pessoal, sobretudo para os profissionais que estão na linha de frente no combate à pandemia pelo Covi19.
Muitos médicos empresários, exploradores de outros médicos, discursam em mídias sociais e imprensa patrocinada, sobre corrupção como doença maior, atacando xenofobicamente países que dispõem de ações humanitárias que correm o planeta indistintamente sem qualquer preconceito ideológico para, ao fim, salvar vidas como acontece agora em diversos países vítima dessa pandemia, sem que possamos aqui discutir os critérios financeiros envolvidos nessas ações remuneratórias dos médicos estrangeiros.
Estes empresários médicos são hoje os representantes regionais da extrema direita política, muitos deles são beneficiários de recursos do SUS exatamente em especialidades rentáveis para suas clínicas e hospitais, mas, como são portadores de uma enorme cara de pau, que nenhum óleo de peroba é capaz de encerar, ainda assim, posam de isentos ou de grandes beneficentes. São a um só tempo, empresários inescrupulosos e médicos que eu caracterizaria como equiparadas a trabalhadores de chão de fábrica, e tal qual bem define o ditado popular, são como a tampa e a caçarola numa relação entre uma convicção estúpida desses semideuses e a postura hipócrita dos verdadeiros corruptores do Sistema Único de Saúde.
Hoje é de fato um triste dia para se comemorar a saúde por aqueles verdadeiros heróis, que com ética e com consciência de classe estão voltados para atender aos que precisam de cura, de alívio e mitigação da dor.
Wagner Bomfim
07/04/2020