Os negacionistas de jaleco branco

  


          A crise política  gerada através da insatisfação da elite financeira e seus capatazes com os governos populares desde o início desse século, colocou em evidência uma categoria, antes silenciosa, omissa e imersa no seu labor individualista, no caso a classe médica.
          As demandas sobre a ampliação e melhorias da assistência à saúde, no caldeirão das manifestações políticas que ocuparam as ruas no ano de 2013, teve como resposta a criação de um Programa de Cooperação Internacional de Atenção à Saúde das populações mais vulneráveis dos grandes centros urbanos e das zonas rurais distantes, grotões de um Brasil desprezado pela categoria médica aqui formada.

          Ao contextualizar o médico o identificamos como um representante da classe média, que busca na profissão clássica um meio de ascensão social, trazendo os típicos valores de conservadorismo e manutenção das relações de poder vigentes. Na época citada os interesses do capital financeiro eram bem como permanecem  com a lógica de acumulação do capital via economia médica, colocando os nem sempre incautos médicos, como adversários do referido programa de cooperação internacional na área de saúde, o Programa Mais Médicos.  

          Essa postura adversa ostentava claramente, sobretudo, uma reserva de mercado  de trabalho dentro dos grandes e médios centros urbanos, e que expressava  por si só muito mais que qualquer suposto altruísmo, defesa de uma melhor qualidade assistencial e sua vinculação com uma prova de conhecimentos para adequação curricular – Revalida- ou mesmo solidariedade com o seu povo. Tudo isso foi temperado com uma sanha agressiva aos partidos políticos governantes da época,  que tinham uma clara opção por políticas públicas inclusivas e distributivas.

           Feita essa consideração não podemos nesse momento falar que o médico é um cavaleiro andante a enfrentar as mazelas dentro de hospitais e ambulatórios superlotados, um ser apolítico, destituído de ideologia, alheio a toda e qualquer visão de mundo, quer seja de direita, individualista, quer seja de esquerda, com uma visão de mundo pautada na atenção coletiva, solidária.
         


           Não existe neutralidade axiomática nem no saber médico nem na sua práxis. O médico hoje é um trabalhador precarizado como outro qualquer, alimentando os interesses econômicos daqueles que os exploram seja como empregado mal remunerado do serviço público ou explorado por empresas privadas, e tanto num como noutro trabalho sob a modalidade de Pessoa Jurídica- PJ, para desespero da Receita Federal, por hora, perpetuando uma formação elitista e superespecializada.

Essa formação é estruturada com  a manutenção de currículos acadêmicos baseados num padrão operacional onde o modo de agir é artesanal, sendo dotado de criatividade e de inventividade, mas, distantes do modo de trabalho atual e dissociados das reais necessidades de saúde da população, reflexo portanto de uma atuação individualista, privatista e nada solidária.

          Na atualidade a classe médica é representada  por grupos políticos negacionistas, omissos,  pra não dizer cúmplices, frente à maior tragédia sanitária da história do país que já matou centenas de milhares de brasileiros por conta de um projeto de governo necropolítico, projeto ao qual esses conselhos estão criminosamente aliados. Esses grupos de serviçais, nada interessados num romântico ideário de servir ao cidadão, ao ser humano, passam ao largo, posto que usufruem, como numa dinastia, das mordomias pagas pelos trabalhadores médicos precarizados, através das vultosas, sofridas e obrigatórias anuidades auferidas pelos conselhos regionais de medicina. Esses representantes volta e meia  ao se depararem com críticas públicas expressas por representantes da sociedade civil se sentem   “melindrados, ” “ofendidos” em seus preceitos éticos  duvidosos tal qual recentemente ocorreu ao serem questionados por um Doutor em Comunicação da UFBA.


          Os vetustos  jalecos brancos ao fugirem do debate necessário, tentam descaracterizar uma pertinente crítica, atribuindo-lhe um discurso de ódio em verdade inexistente em sua fala crítica. Essa  é uma postura clássica, abjeta, lugar comum dos oportunistas, que passeiam pelos gabinetes de políticos tanto de esquerda quanto de direita, ao sabor de suas  veleidades, sem contribuir efetivamente para uma mudança da realidade perversa a que a classe médica, despolitizada, está submetida.
          O compromisso de qualquer médico é, com certeza, voltado para a pessoa humana. O seu ato é incontestavelmente um ato político. A omissão sim, se inscreve como o pior dos atos políticos de qualquer cidadão e por conta dele além dos exemplos recentes de protofascistas se exibindo em largas avenidas país afora, com suas camisas verdes amarelas no melhor estilo Plínio Salgado, ou como outros boçais que vão comer croissant em cafés parisienses, vivemos uma tragédia humanitária sem precedentes e, portanto, carentes da  responsabilidade e do cuidado que a sociedade a esses profissionais lhe outorgou.
         

O ódio não está na crítica do comunicador ou de próceres da sociedade civil, pelo contrário, encontra-se no âmago dos negacionistas, dos omissos e dos oportunistas, que aparelhando órgãos de classe se tornaram cúmplices desse Armagedom.

Foto 1 :  Marcelo Camargo 

Foto 2: blog.oglobo
Foto 3: Max Ventura
Foto 4: tempoms.com

Wagner Bomfim



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5 Comentários
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Unknown
3 anos atrás

Nem precisa procurar saber qual o engajamento politico de quem fez esse raso e tendencioso comentário rebuscado.

fotoegrafia
4 anos atrás

Xxxxx

Wagner
4 anos atrás

Obrigado a voces por compartilharem desse sentimento de indignação com a tragedia instalada por um governo que despreza a ciencia!

Neci Soares
4 anos atrás

Parabéns Wagner
Importante o seu pronunciamento como médico, mostrando que tem o outro lado que está na luta pela vida, que acredita na ciência.

Alice
4 anos atrás

Adorei a análise. Parabéns!

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Comentários

  1. Franklin Passos em Análise
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