A naturalização do mal.
Morei em Curitiba, desde o final da década de 60 até 1978, dos três aos doze anos. Além do clima e temperamento frios, respectivamente, do lugar e das pessoas, convivi com uma cultura e costumes peculiares e que foram um dos meus primeiros referenciais para a minha formação como pessoa. Fiz com a minha família, assim como milhares de nordestinos, o caminho para onde existiam maiores oportunidades de trabalho.
A civilidade, o respeito ao direito alheio e a educação passaram a ter um significado que me marcou, assim como o modo de ser do curitibano em que não há muita interação entre as pessoas. A limpeza das ruas e avenidas, das praças bem cuidadas e do transporte coletivo exemplar. A qualidade do ensino nas escolas, tudo muito significativo.
Estudei em duas escolas, sendo uma mantida por uma sociedade espírita (soube desse detalhe décadas depois) e outra municipal. Do antigo pré-primário até a quinta série, somente duas professoras negras, inclusive, soteropolitanas. Quase todas brancas, de ascendência europeia, assim como meus colegas. Conto, nos dedos de apenas uma mão, os colegas negros e pardos, assim como eu. Os demais tinham sobrenomes poloneses, italianos, alemães e outros. Eram os Ukowsky’s, os Szerbowski’s, os Ferrari’s e os que minha memória não guardou.
Os da minha geração cresceram convivendo com o costume de chamar um colega de Neguinho, não pelo seu nome, sem nos incomodarmos em nada com uma demonstração que hoje, confirmaria o racismo estrutural que sempre vivemos. E o de oferecer bananas com um riso maldoso no olhar? Lembro-me de uma foto, em um livro didático, na qual aparece um chimpanzé numa cápsula espacial americana e alguns colegas escreveram o meu nome na foto, num comportamento que hoje seria bullying. Ou seria o comportamento naturalizado de crianças que seriam futuros cidadãos de bem?
“Segundo estudos, a renda de negros e brancos só deverá ser equiparada no Brasil em 2089. O Brasil deve levar dois séculos, desde a abolição da escravatura, no fim do século XIX, para equiparar a renda de negros com brancos, isso se a tendência de redução da desigualdade dos últimos 20 anos for mantida. A conclusão é do relatório “A Distância Que Nos Une”. De acordo com o estudo, negros e brancos terão rendas equivalentes apenas em 2089 — a Lei Áurea, foi promulgada em 1888. Em relação à disparidade de salários entre gêneros, as mulheres tendem a passar a ganhar como os homens um pouco antes, em 2047.
Os números obtidos pelo estudo mostram que os negros recebem menos que os brancos mesmo com a mesma escolaridade: enquanto brancos com diploma de nível superior recebem R$ 4,1 mil, em média, negros com o mesmo nível de graduação escolar ganham R$ 2 a 3 mil (média geral). Segundo um estudo, um médico negro ganha aproximadamente 88% do salário de um médico branco.”
Então, somos brindados com algumas colocações de brancos, politizados, engajados na discussão de temáticas sobre racismo, relativizando sobre a validade das cotas raciais, onde a disparidade de renda e de oportunidades faz do Brasil o 10º mais desigual do mundo e as políticas públicas, mal implementadas, ainda não trazem os resultados e, além disso, foram sabotadas. Como diria um bom baiano: “Me faça uma garapa!”
Franklin Passos
(Fonte: globo.com e https://www.negritudesocialista.org.br/renda-de-brancos-e-negros-so-deve-ser-equiparada-no-brasil-em-2089/).”
Só em ler causa mal-estar.