Meu sangue de negra herança
Dá-te a mão, te chama à dança
Em revoltoso panavueiro.
Será um dia qualquer
Qualquer dia festeiro
Caixilhos, cordas, cordeiros
E a todos que o coração embala
Massa açulada, ignara
A enfrentar o branco de cara
Em pleno mês de fevereiro.
Já tens um revoltoso soldado
Aqui, o corpo é o próprio escudo
E o peito não fica mudo
Ante o horror inominado.

São calos, são cordas tecidas
Aprisionando as mãos e as vidas
Em perpétua servidão
São filhos de pretas, de putas, mulatas
São baderneiros de latas
Escondidos na multidão.
Seis dias criando o mundo
No sétimo em sono profundo
Da sarjeta escurraçado
Ante o lixo embalado
que o mesmo irá renovar

São cordas, cordeiros
de um só impoluto Deus
Que os imolam em profanos bacanais
Gozos ardentes vistos
enquanto os filhos teus
Professam tristes dores e ais.
A Revolta dos Cordeiros e
A Revolta dos Ambulantes
São como cavaleiros andantes
Batalha duma guerra desigual
Teu corpo, voz e memória
Que importa? ficará solene na história
Guerreira, lança, imortal !
Wagner Bomfim
23/02/2023
O racismo estrutural e institucionalizado !!!!
A triste situação dos cordeiros do Carnaval recebe do poeta a voz bela e melancólica de uma saga ainda sem fim.
Atitude! Que adianta a habilidade, no fazer bem e direito, se não houver atitude? Principalmente na escolha do não fazer, não se submeter. Cada gesto, cada grito, mesmo que surdo, cada olhar para frente, vale muito, contra um sistema ingrato, explorador e tirano.