O gênero e a língua

A razão dessa nossa fala de hoje é apenas retomar uma discussão que volta e meia surge no seio das academias de letras, entre os linguistas, certos coletivos sociais e puristas da língua portuguesa.
Vossa Mercê por certo irá estranhar essa forma pronominal citada, mas ela serve como introdução da discussão sobre a chamada linguagem neutra. Aquela onde os artigos definidos o e a cedem lugar para outras desinências, ditas neutras, para contemplar pessoas que não se identificam nem com o gênero masculino nem com o gênero feminino.
Como surgiu? Por que surgiu? Qual a sua importância no atual momento sócio político e cultural?
Essa forma de denominar certas pessoas independente do gênero ou sexo surgiu desde a década de 60 na Suécia com a expressão Hen, portanto já existe há mais de meio século. Aqui no Brasil, porém, com a afirmação sócio política de coletivos LGBTQIA+, a inserção de pronomes como Elu-delu-ile, palavras como todes, amigue, amigx encontra o respeito entre as pautas públicas do governo atual.

Um pouco de estudos da neurologia e neurofisiologia pode contribuir para discussão. A fala e a escrita estão situadas em uma área cerebral localizada no Córtex pré-frontal póstero lateral e área pré-motora, a chamada Área de Broca bem como no lobo temporal do hemisfério esquerdo, a Área de Wernicke que propicia a percepção da linguagem.
Vosmicê já se pergunta o por quê dessa neuro-anatomia, mas importa falar da neuroplasticidade funcional que envolve a capacidade de regeneração, adaptação a novas situações oriundas de traumas e ou aprendizagem de novos conhecimentos, demandando novas conexões sinápticas em outras áreas cerebrais. Essas possibilidades acontecem frequente e exatamente no córtex pré-frontal.


Voltando a questão da linguagem sabemos que ela se desenvolveu primariamente nesses centros nervosos como consequência da imitação de sons repetidos entre humanos e animais.
Hoje o que acontece é que Você fala de maneira formal ou coloquial respaldada nas normas léxicas e gramaticais que as línguas preceituam e no nosso caso o bom português brasileiro e para nós, na miúda brincadeira, o baianês.

“A finalidade da linguagem não binária é atender a um público que precisa dela: as pessoas que questionam o seu gênero.

Queremos uma linguagem comunicativa, inclusiva e que questione padrões. Não nos interessa, por ora, mudar a gramática normativa, porque ela é machista, elitista, construída por homens brancos”,(1)

Para ativistas dos movimentos LGBTQIA+ a introdução da linguagem neutra, combatida em estados da federação de posição política mais conservadora, é, na verdade, a forma representativa centrada no masculino(1).

Certos autores definem que a linguagem neutra situa-se como uma expressão meramente inclusiva, portanto intimamente ligada a movimentos sociais(2).
Necessário, contudo, verificar as estratégias de neutralização de gênero que torna o nosso idioma amputado, uma vez serem necessárias outras desinências, pronomes e sintagmas para uma boa compreensão entre os humanos. Necessário se faz romper com os conceitos de marcação ( o não convencional, o anormal, o disruptivo) que o masculino representa o genérico. Essa é de fato uma construção milenar, patriarcal.

“Em todas as sociedades, existe sempre um grupo de pessoas, uma classe social ou uma comunidade local específica, que acredita que o seu modo particular de falar a língua é o mais correto, o mais bonito, o mais elegante e, por isso, deve ser o modelo que as outras classes e comunidades precisam imitar” (3).


As mudanças de gênero ao longo dos anos propõe ou pressupõe novos enfoques na psicolinguística, sociolinguística, na semiologia e análise do discurso.

Vossa Mercê, Vosmicê, Você ou mesmo , sabe do caráter dinâmico da língua. Sabe que as manifestações de determinada linguagem se impõe como atuação de grupos, de guetos, ou de coletivos que se reconhecem nessa neuroplasticidade funcional da língua. Daí a surgir e haver um regramento impositivo desses ou dessas expressões serão necessários a quebra de preconceitos e a evolução inevitável pela qual sofre a língua. Importa, portanto, a quebra de paradigmas.
Portanto, no momento como posso lhe convidar para refletir sobre o tema minha amigue ou meu amigx?
A todas as pessoas ou o todes os pessoas ou a todes pessoas?
O futuro dirá.

Wagner Bomfim
08/03/2023

Referências

1- Ferreira,C. UFPb

2- Melo, I. Linguista . UFRPE

3- Bagno,M. UnB 2012.

 

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Ivonize
Ivonize
2 anos atrás

Tema complexo . Não acredito que vingue este tipo de linguagem , O nosso país é machista e conservador . Veremos !!!!

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Comentários

  1. Neci Soarea em Análise
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