Ou uma Bahia sem folguedos
Devo dizer que esse texto nada tem de saudosismo piegas, para enumerar reminiscências perdidas. É apenas uma referência para situar a Bahia de hoje, desfigurada econômica e culturalmente.
De há muito o polo econômico e cultural migrou para o eixo Rio-São Paulo, ficando a Bahia relegada a mera consumidora de tudo que era e ainda é produzido no sudeste, terras de uma cultura pasteurizada pelos grandes veículos de comunicação espelhada no American way of life.
O período desenvolvimentista prometido pela ditadura militar centrou-se na indústria paulista, com aumento do capital internacional, localizados sobretudo na região do ABC, perímetro industrial, enquanto espasmos de produção industrial de mera transformação ou zonas isentas de tributos federais foram acomodadas na Bahia, Manaus e Recife.
A Bahia produzia e transformava sua matéria-prima, sobretudo os derivados do petróleo, para ser acabada no sul maravilha, que de lá retornava com valor agregado para depois ser consumida aqui e assim, tal política, mantinha a Bahia com décadas de atraso industrial, se é que destruir o meio ambiente pode ser sinônimo de progresso. Isso nos faz lembrar daquela música de Gerônimo, Abafabanca! Tudo isso sob a égide política de uma família alinhada com os ideais da extrema-direita e que se locupletou no poder durante longas quatro décadas.
Na cultura, as décadas de 60 a 80 na Bahia foram referenciadas no teatro pela diva Nilda Spencer e a música, ah! a musica, com o tropicalismo e os novos baianos mais uma vez expunha a Bahia, como já o fizeram Caymi e João Gilberto, como polo criador e, que transpôs as fronteiras mundo afora.
Passados seis meses do novo governo petista, não identificamos até então um planejamento do governo focado no incremento da economia com geração de emprego e renda, com reflexos na saúde, o desenvolvimento de uma revolução educacional retirando-a do atraso, investimentos na segurança pública, não estou falando de policiamento ostensivo mas de segurança pública voltada para o cidadão, com redução do morticínio de pretos, pardos e, todos eles pobres!
Hoje, em pleno período junino, época em que o nordeste movimenta sua economia com inúmeras cidades promovendo suas festas de São João, assistimos cada vez mais a desvirtuação da autêntica música nordestina, o forró, o xote, o xaxado e baião, sendo trocada por “cantores do agronegócio” com sua epopéia de temas como embriaguez , “dor de corno” e infames vinganças amorosas. “Cantores” esses que tem, cada vez mais, se locupletado com verbas públicas, sobretudo como ocorrido ao longo dos últimos quatro anos.
A despeito da iniciativa existente no Congresso Nacional de um Projeto de Lei de Fernando Rodolfo (PE), para destinar 80% dos recursos públicos para cantores, bandas e assemelhados nesse período de festas juninas que sejam genuinamente vinculados a cultura local, aqui, o governo do estado coloca como atração principal no Pelourinho, em Salvador, um cantor envolvido até o pescoço em maracutaias com prefeituras do interior de alguns estados, faturando milhões que deveriam ser destinados a outras ações públicas mais prementes como educação e saúde.
Repete-se, nesse particular, práticas de certos gestores em convidar “cantores” totalmente desvinculados da cultura nordestina, onerando o erário com algo inconcebível para a população. O governador, oriundo do interior do estado e, portanto, conhecedor de suas raízes, deveria ver respeitada essas manifestações populares com a valorização de genuínos forrozeiros, preservando a cultura local para alegria de milhões de nordestinos, isso sem falar na Lei estadual, “Lei da Zabumba”, totalmente descumprida por prefeitos e governadores nas últimas décadas.
É preciso avançar em vários aspectos, além de garantir um governo democrático como feito nas últimas eleições, mas, ter um planejamento estratégico das cidades e do estado, norteando claramente a vocação loco regional, industrial, agropastoril, etc, sem descurar que a Bahia dispõe de um inesgotável manancial turístico, e toda economia nele inserto, que não pode ficar à deriva, sobretudo no quesito cultural, onde cada vez mais verificamos sua rica expressão ser pasteurizada, ressignificada, bem ao gosto dos donos do poder.
O Agro é pop!
Wagner Bomfim.
18/06/2023
Excelente texto, mostrando a vituperação cultural. Apesar de não mais me emocionar e nem me envolver em festas desse gênero, fico indignada com as políticas públicas voltadas para a comercialização das manifestações culturais, antes genuínas e puras.
Parabéns ilustre Confrade.
Sempre cirúrgico e atual.
Cuidemos do que é nosso patrimônio (cultura), que é um baita alimento da alma.