Uma selva de concreto
Enquanto o Rio Tâmisa em Londres e o Rio Sena em Paris voltaram ao seu estágio antigo de total balneabilidade, melhorando a qualidade de vida dos seus habitantes a ponto dos mesmos poderem se banhar nesses rios em pleno e escaldante verão europeu, o Brasil, e Salvador em particular, destrói sem piedade seus mananciais hídricos, tornando a cidade baiana uma das capitais mais inóspitas do país no quesito verde, meio ambiente, transformando-se num gigantesco bloco de concreto.
No meio desse processo de verticalização, vê-se uma disputa de gestores públicos por mobilidade urbana feita de forma desordenada, antenada muito mais aos interesses do grande mercado imobiliário e totalmente dissociada de sustentabilidade ambiental.
O Projeto de Requalificação da orla de Salvador, no trecho compreendido entre Patamares até Piatã, cujo projeto é de Sotero Arquitetos, tendo a responsabilidade da SEDUR e da FMLF parece não incorporar funções precípuas de uma consequente intervenção, o benefício ao homem e sua sobrevivência.
Enquanto nas últimas décadas as intervenções da prefeitura se basearam no mesmo modelo de “praças secas” ou “ruas secas” “esquecendo” do manancial hídrico do entorno, cresce a olhos vistos uma ocupação urbana do solo com perfis de crueldade ao meio ambiente. O perímetro urbano, onde deságua a foz do Rio Jaguaribe, encontra-se à deriva por conta do desinteresse dos poderes públicos e em muito pouco tempo poderá ser condenado à extinção, a exemplo do ocorrido com outros rios da cidade de São Salvador.
O Tribunal de Contas da União-TCU – desde a publicação de seu Relatório de Fiscalização 119/2016 datado de 06/09/2016 já condenava a Conder, seus diretores, na aplicação dos recursos públicos advindos de financiamento da CEF que deveriam ser aplicados na revitalização do leito do Rio Jaguaribe e Mangabeira.
Inúmeras falhas na aplicação dos recursos foram constatadas, como a inexistência de ações efetivas de intervenção da coleta de lixo pela Prefeitura, a ausência de drenagem e do esgotamento sanitário de responsabilidade da Embasa desde o seu nascedouro no bairro de Fazenda Grande até sua foz. Toneladas de lixo jogados no leito do Rio Jaguaribe e Mangabeira, águas sem qualquer tratamento, tornaram a bacia do Jaguaribe num pestilento promotor de doenças de várias naturezas para as comunidades do seu entorno e dos frequentadores das praias de Patamares até Piatã.
A situação piora dia a dia, cujo rio se tornou um esgoto ao ar livre, sob os olhares de uma classe média desses bairros, que pagam fortunas de IPTU a Prefeitura e taxa de esgotamento sanitário a Embasa sem a efetiva melhoria das águas e da omissão criminosa dos poderes públicos, prefeitura e governo do estado no quesito meio ambiente.
Padronizar de tijolinhos os passeios junto às praias, dotando-os de ilhotas de bicicletas de um Banco privado ou ceder nebulosamente o espaço público para exploração comercial, configura-se apenas como obra midiática às portas das eleições municipais. Esses equipamentos são de menor importância ante a magnitude do manancial hídrico, no caso o Rio Jaguaribe. Não tem o condão de modificar o cenário desolador sobre o ambiente, que fatalmente poderá sucumbir com mais pistas de asfalto e concreto, em breve, com mais essa intervenção predatória.
Encampado pela Prefeitura, a consumir milhões de reais do contribuinte, o atual projeto é totalmente dessintonizado da preservação e recuperação da Bacia do Jaguaribe, posto que não intervém no nascedouro da poluição, porquanto não modifica o espaço onde vivem milhares de pessoas ao longo do seu percurso.
O modelo de requalificação de toda a orla, desde Plataforma até Itapuã, é mais que “praça seca”, são vias de cimento, aço inox e cal, sem o elemento natureza, com o soteropolitano distante do centro do real interesse, ou seja, ter melhor qualidade de vida.
O Rio Jaguaribe pede socorro.
Wagner Bomfim
03/01/2024
realidade… aqui o Rio Jacuípe tb pede socorro