Câmeras Corporais. Instrumento de transparência?

Câmeras corporais.

Instrumento de transparência?

Há décadas a Bahia vem sofrendo com o aumento da violência urbana, sabidamente gerada pelas contradições sociais de classe, bem como pelo incremento do narcotráfico importado dos estados do Sul e sudeste.

As facções aqui encontraram o território fértil para sua propagação, local onde se sobressaem os grandes bolsões de miséria, a falta de saúde de qualidade, muito além da construção de hospitais, a ausência de uma educação revolucionária e libertadora, além da mera aprovação vigente e sobretudo, a pouca geração de emprego e renda necessárias para um desenvolvimento sustentável.

O governo baiano divulga uma propaganda institucional focando a utilização de câmeras corporais dos policiais para oferecer “mais transparência e eficiência das forcas policiais e mais segurança para a sociedade”.
Os direitos sociais elencados acima revelam-se sofríveis em todos os seus indicadores, sobretudo quando as ações do estado brasileiro atuam ou deixam de atuar nas áreas mais carentes.

No quesito enfrentamento às drogas, repete os crassos erros de combater o varejo das drogas meramente numa ótica policial, quando as nações civilizadas a conduzem sob uma outro olhar e mister proporcionando saúde fisica e social a ex dependentes. Aqui prefere confrontar pretos, pardos e pobres associando-os  a um racismo estrutural  e aumentando sobremaneira a letalidade policial.

É absurdo o número de corpos de jovens PPP (pretos, pardos e pobres) entregues nas emergências dos hospitais com justificativas de brigas entre gangues, onde as cenas, locais dos crimes, são desfeitas para alívio do Ministério Público desinteressado em investigar cada morte, cada crime.

Conforme mostrou o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, o Brasil teve 6429 mortes em intervenções policiais, 17 mortos por dia com 83,1% de negros vitimados. Das 47398 mortes violentas ocorridas em 2022, 76,9% foram negros, 91,4% do sexo masculino e mais de 50% tinham entre 12 e 19 anos.

Quanto às mortes de 161 policiais no período em questão, 70% ocorreram nos períodos de folga, fora, portanto, do turno de trabalho.

Câmeras corporais, coletes à prova de balas e o uso adequado de armas devem ser equipamentos para ações ostensivas pontuais, para preservar as vidas. A regra existente nas forças policiais para o combate ao narcotráfico impõe uma letalidade, ceifando vidas, gerando sofrimentos e implica num desperdício desnecessário dos recursos públicos para a superação da violência urbana e do combate às drogas, que notadamente não se circunscreve apenas  às regiões mais carentes socialmente.

Resta perguntar se essas câmeras corporais estarão filmando e permitindo acesso transparente a qualquer cidadão em tempo real ou se terão imagens editadas, sob sigilo, para o corporativismo prevalente nas forcas policiais de norte a sul do país. A saber qual metodologia transparente será empregada.

A Bahia é o segundo estado mais letal do país, atrás apenas do Amapá, campeão e vice do morticínio vigente nos recônditos da pobreza e conflito urbano. Câmeras corporais, a priori, pode não se inscrever numa política pública mais consequente para redução dos tristes indicadores de segurança a médio e longo prazo.

Enquanto o Estado brasileiro não se fizer presente no seio social mais carente, priorizando a cidadania, o direito ao emprego, à saúde, à educação, à cultura e ao lazer, restará, infelizmente, somente a necropolitica*.

 

Wagner Bomfim.

27/07/2024

*Achille Mbembe

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Cacilda Santos
Cacilda Santos
10 meses atrás

Gosto da sua janeira de análise. .

Wagner
Wagner
10 meses atrás
Responder para  Cacilda Santos

😁

Lorena
Lorena
10 meses atrás

Que dado alarmante, segundo estado mais letal. As políticas públicas têm que vir de base, visando uma melhora consistente de indicadores sociais.

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  1. Franklin Passos em Análise
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