O coração, o déspota e o patrono da opressão.

Parte I

Chegou em Brasília no último domingo, dia 21 de agosto, o coração de D. Pedro I, para, inusitadamente, participar das comemorações do bicentenário da Independência do Brasil.

Os mais incautos dos brasileiros por certo terão seus corações em júbilo por um feito, o famoso Grito do Ipiranga, fantasiosamente retratado pelo artista Pedro Américo. Passa a ideia naquela pintura que ali de fato residiria a nossa libertação do jugo português/espanhol e subliminarmente do reino inglês e seus interesses econômicos no século XIX.

Centralizar num resto mortal especifico de D. Pedro I, no caso um coração envolvido em um líquido dourado e cristalino, quando sabemos de há muito que os outros restos mortais encontram-se depositados na cidade de São Paulo, revela uma clara apologia à política necrofílica desse desgoverno, que se utiliza de uma estratégia, uma prática sutil, de colocar no panteão da história os representantes da realeza, “vultos” de uma elite econômica dominante tal qual ocorreu noutros países sul-americanos.

Em diversos países latino americanos, a exemplo da Argentina representada pela figura de José Marti, de Pedro de Valdívia no Chile e mesmo Simon Bolívar na Nova Granada de Espanha, hoje Colombia, Equador e Venezuela, no decorrer do século XIX sabemos que os mesmos eram incontestáveis representantes das oligarquias agrárias, que descontentes com a tributação espanhola geradora de grande espoliação de suas riquezas então transferidas para Europa. Tal inconformismo desencadeou os processos de levante contra as forças colonizadoras com o paulatino desmonte das estruturas de dominação na américa espanhola. Esses representantes foram alçados a libertadores desses povos, porém, a história nos mostra, frustrando os interesses dos povos originários, posto que essas nações ainda hoje continuam vivendo em estados desiguais.

Seja em Brasília, seja em Copacabana ou em qualquer avenida desse país num desses desfiles escolares e de ridículas exposição de militares, não será um coração qualquer boiando dentro de uma redoma com liquido reluzindo a ouro, que de fato pulsará no âmago desse sofrido povo.

Parte II

O dia de 24 de agosto marca a história do Brasil de forma indelével pela morte/assassinato de, para muitos historiadores, um estadista Getúlio Dornelles Vargas.

Na madrugada daquela terça feira de agosto, um tiro de revólver no peito punha fim a longa Era Vargas. Assim, como na parte I acima o Imperador Pedro I assumiu o seu lado de governante déspota, quando logo após a sua coroação ,cercou com suas forças militares a Casa da Cadeia, onde se reunia os Deputados da Assembléia Nacional Constituinte de 1823, a chamada “Constituição da Mandioca”.

Prendendo, exilando e dissolvendo portanto o embrião de um estado brasileiro, fez valer o seu ” poder moderador” posto que aquela Constituição era francamente contrária aos interesses imperiais ao tempo que ela reduzia seus poderes bem como ampliava significativamente a dominação politica e econômica do setor agrário sobre a monarquia.

Mais tardiamente seria Getúlio Vargas que também viria a exercer a sua veia autoritária, baseada nos seus interesses classistas de latifundiário. Essa práxis foi revelada desde sua primeira passagem pela Presidência da República, quando em não respeitando a soberania popular através do voto atropelou o processo democrático incipiente. Naquela oportunidade veio a tomar o poder conquistado nas urnas pelo comunista Júlio Prestes, e através de um golpe militar acabou implantando o Estado Novo de clara feição fascista.

Desde o século XIX que assistimos a presença dos militares como braço armado da elite agrária a ditar os rumos desse país que se pretende um dia a ser nação. Desde o sufocar de rebeliões ocorridas no período regencial a exemplo da guerra dos Farrapos, dos Malês, da Balaiada, passando pela Ditadura Militar de 1964 a 1985 e mais recentemente o Golpe de Estado de 2016. assistimos a esses golpes militares, para uns lenientes e reacionários de direita, tidos como um poder moderador, mas para a população geral revelam-se como jugo ditatorial onde sobram baionetas, balas e tortura, que vão ferindo de morte os anseios populares.

No presente ouvimos os estertores do coração getulista impregnados na Petrobrás, na CLT, na atividade sindical como exemplos de realizações no período em que governou, em franco descompasso, batendo cada vez mais lentamente, dotando o povo brasileiro de inação profunda e miséria.

Parte III

A existência de forças de segurança num mundo belicoso como o que vivemos é vital para garantia da soberania de um pais, de uma nação.

O que aqui pontuamos, contudo, é a utilização dessas forças de segurança como elemento de contenção das aspirações populares voltadas contra o seu próprio povo.

O então Coronel Caxias foi um exemplo de militar que se destacou por sufocar diversas rebeliões e insurgências no período do império, acabou ganhando destaque ao comandar as tropas brasileiras na Guerra do Paraguai. Naquela oportunidade, atendendo aos interesses do Império, leia-se tambem os interesses ingleses, o militar veio a ganhar titulo de nobreza de Duque e hoje é considerado o Patrono do Exército Brasileiro. Entretanto, a história contada na ótica do dominador esconde a nua e crua realidade dos fatos. Os feitos de combate do Duque de Caxias na Guerra do Paraguai revelam-se diferentes do que se propala por essas terras quando em verdade ocorreu um verdadeiro genocídio em terras guaranis, época em que a pujante nação de Solano Lopez emergia economicamente contrariando os interesses econômicos de Brasil e Inglaterra. Para frear esse crescimento seriam necessárias medidas para sufocar a sua economia, nem que fosse preciso guerrear e exterminar populações inteiras, tal como aconteceu.

É fato histórico, revelado nas batalhas finais daquela guerra que dizimou completamente o exército Paraguaio, que dispunha apenas de velhos, mulheres e crianças. Na famosa Batalha de Acosta Ñu ( ver o Dia del Niño em 16 de agosto no Paraguai) o exercito paraguaio dispunha de 3000 crianças com idades entre 10 a 14 anos que eram a ultima resistência a uma tropa brasileira de 20000 soldados,tendo sido por esses exterminados.

Pois bem, colocar o Duque de Caxias no panteão da glória revela tão somente a face da escravidão, a submissão desse povo ao opressor colonizador e aos criminosos que se sucedem ao longo da história.

Exemplos recentes como o ocorrido no bairro Soleil no Haití, como os inúmeros casos de assassinatos e aumento da mortalidade de populações dos morros cariocas durante a intervenção militar no Rio de Janeiro no período de governo do golpista Michel Temer, são exemplos atuais de extermínio de pessoas, populações inteiras.

Existem dentro das forças de seguranças nacionais vários e nobres exemplos de patriotas, que não comungam com práticas nefastas como citado, devendo sim esses militares serem destacados como exemplo de patriotismo.

Hoje, ao comemorar o Dia do Soldado ( 25/08) esses exemplos funestos e a conotação necrofilica desse governo se nos envergonha enquanto povo, nação insurgente, hoje escória do mundo.

Wagner Bomfim

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  1. Neci Soarea em Análise
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